Editora: Intrínseca
Páginas: 208
Classificação: 4/5 estrelas
Um menino que vira gafanhoto e foge com um grupo de gansos; uma princesa com língua de cobra à procura de um príncipe com quem se casar; canibais ricos que comem braços e pernas de peculiares que têm o dom de se regenerar são alguns dos personagens dessas narrativas que há séculos povoam o imaginário dos peculiares, oferecendo não apenas valiosas lições, mas também pistas para informações secretas, como a localização exata de certas fendas temporais, por exemplo. Compilado por Millard Nullings, o menino invisível acolhido no lar da srta. Peregrine, o livro inclui surpreendentes comentários e notas, além de um desfecho alternativo para a tocante história do gigante Cuthbert, já conhecida dos leitores da série.
Nosso querido autor Ransom Riggs, a mente peculiar por trás dos livros do universo de Srta. Peregrine, parece ter entrado para o time de escritores (como Cassandra Clare e Rick Riordan) onde o sucesso da série original é tão grande que acabam por idealizar novas séries e livros adicionais, e ainda assim não perdem a qualidade na hora de escrever. Com base em que afirmo isso? Primeiro porque o autor já divulgou uma nova saga com os personagens da trilogia original e também na leitura de Contos Peculiares, foco dessa resenha.
Favor não ler o terceiro conto deste livro de trás pra frente em voz alta – o organizador da obra não se responsabiliza pelas consequências.
Pra entender a premissa da obra, devemos compreender o livro como o próprio Contos Peculiares, que é mencionado em várias passagens da trilogia. Não apenas um spinoff, com este trabalho Riggs vai além e traz respostas para alguns mistérios de origem da mitologia da série como, por exemplo, o surgimento da primeira Ymbryne.
O que muito me impressionou foi a habilidade de em poucas páginas construir personagens tão interessantes quanto ambivalentes. Embora faça uma ponte com o esquema dos famigerados contos de fadas de nossa realidade, a fórmula não é previsível. A princesa da língua bifurcada é um exemplo. Sendo um dos primeiros contos da coletânea, você pode se impressionar com o comportamento de alguns personagens qual conhecerá no decorrer da narrativa.
Como não poderia faltar na raiz de uma fábula, cada conto possui sua moral, mas não de forma direta. A cada final de leitura as peças soltas se juntam de acordo com a subjetividade do leitor, o que torna tudo ainda mais legal, pois vai muito além dos valores de cada um. Mesmo que o autor quisera ter passado algo específico ali, há margem tanto para alguém que não consiga enxergar a moral quanto para a existência de pessoas que veem muito além da ideia original. A narrativa de Ransom Riggs é fluída e se modula de acordo com a proposta deste trabalho, que é trazer uma roupagem mais fantasiosa do que seriam histórias para serem contadas a crianças.
Por fim, posso afirmar que não é uma leitura desperdiçada e puramente caça-níquel. Agrega e muito ao universo introduzido nos livros e só veio a somar. Fico no aguardo da nova série, seja para confirmar o talento do autor ou me decepcionar, pra ontem!
Não vale a pena sacrificar um fio de cabelo sequer por nossa imagem, muito menos uma vida.
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