Editora: Suma de Letras
Páginas: 400
Classificação: 5/5 estrelas
Nas frigidas madrugadas, em uma angustiante cidade do Centro-Oeste, centenas de pessoas desempregadas estão na fila para uma vaga numa feira de empregos. Sem qualquer aviso um motorista solitário irrompe no meio da multidão em um Mercedes roubado, atropelando os inocentes, dando ré e voltando a atropelá-los. Oito pessoas são mortas, quinze feridos. Em outra parte da cidade, meses mais tarde, um policial aposentado chamado Bill Hodges é ainda assombrado por um crime sem solução. Quando ele recebe uma carta enlouquecida de alguém que se auto-identifica como privilegiado e ameaça um ataque ainda mais diabólico, Hodges acorda de sua deprimente e vaga aposentadoria, empenhado em evitar outra tragédia.
Não é por acaso que Stephen King é considerado o Rei do Terror. Esse simpático senhor é autor de nada menos do que dezenas e dezenas de histórias do gênero, entre outros, como suspense e drama. Mas com Mr. Mercedes, King decidiu quebrar duas de suas raízes de construção: dividiu sua história em uma trilogia e abriu mão do sobrenatural, o que aconteceu em raras ocasiões. Lançado recentemente pela Suma de Letras, o livro mexe ainda mais com o leitor pelo sabor de realidade que proporciona. Mesmo com diversos seres fantásticos que o nosso imaginário construiu como objetos de horror, ainda é de nossos próprios semelhantes que sentimos mais medo. O ser humano, armado constantemente de rótulos e comportamentos privados, sempre será uma caixinha de surpresa, por isso Mr. Mercedes nos causa uma sensação de vertigem.
Temos uma situação que condiz com nossa realidade atual, o desemprego e a crise econômica, e um indivíduo aparentemente pleno de sua saúde mental, mas que possui em si uma monstruosidade sem tamanho que mescla ódio e ego. Dois empregos, uma vida estável, uma mente podre e planos diabólicos. Esse é Brady Hartsfield ou, se preferir, “Mr Mercedes”. Essa realidade tão palpável qual Bill Hodges é lançado é que causa temor pelo desconhecido. O que se passa na cabeça das inúmeras pessoal quais temos contato todos os dias?
De trás do volante do caminhão Mr. Tastey, coberto de imagens de crianças felizes e tocando o som de sinos alegres, Brady acena. O garoto acena em resposta e sorri. É claro que sorri.
Todo mundo gosta do vendedor de sorvete.
Mesmo em suas histórias com elementos sobrenaturais com fantasmas, vampiros e lobisomens em sua composição, o verdadeiro terror narrado por Stephen King se resume à psique humana. São camadas de construção que acontecem simultaneamente para compreensão e espanto com os mais sórdidos e desesperados pensamentos e comportamento de uma pessoa; até onde ela pode chegar. Mr. Mercedes é maravilhoso justamente por preservar esse elemento em um ambiente real, palpável, tão parte do nosso dia a dia.
E ao contrário da maioria dos thrillers de suspense em livrarias, desde o início conhecemos a identidade de nosso psicopata. A narrativa é construída alternando o ponto de vista de Brady Hartsfield, o assassino do Mercedes, e o detetive aposentado Bill Hodges. A construção lenta, mas bem fluida dos dois em seus respectivos contextos nos prende logo de cara. Bill é um senhor muito que esperto e no caminho para desvendar esse caso qual só ele é capaz vai contar a ajuda com personagens únicos quais nos apegamos sem exceção, deixando o leitor com o coração na mão.
Vou matar você.
Você não vai nem me ver chegando.
Histórias do gênero devem ser construídas com o maior cuidado para se chegar a maestria, e nesse quesito Stephen King dá aula. Com Mr. Mercedes garanto que você vai terminá-lo ansiando pelo próximo, mesmo que o enredo desse sendo bem fechadinho. Leitura para virar noites em claro.
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